quinta-feira, 6 de maio de 2010

Menininha de vermelho


Não te amo mais! Grito do fundo de meus pulmões ofegantes. E choro. Lágrimas doces que umedecem o sal da terra. Afundo na lama. Acima de minha cabeça, você. Nas nuvens. Lá, lá longe onde Platão colocou suas idéias. Imagem reluzente, menina escarlatina, deusa da incerteza. Ideal era você. Amava eu sua perfeição. Parecia-me perfeita até demais, diriam os homens de pouca fé. Outros, mais atentos ao chão, diriam que você - tal qual forma geométrica - encaixava bonitinho em meu projeto de mundo justo. Weltanschaaung, como bradam os alemães. Povinho de lingua dura e de argumentação mole. Românticos por demais. Chega um momento em que o pescoço dói, de tanto que olho para as alturas. Por mais longos que sejam seus cabelos, não consigo tocá-los. Cansei! Chuto seu pedestal! Fatalmente, você cai. Se se machuca, não ligo. Estou fatigado demais pra me importar com as dores dum corpo que não o meu. Viro as costas, mas você - chata! - teima em cair em cima de mim. Desconfio que com propósito. Feridas se abrem e resultam numa hemorragia de verbos. Fico tingido de sua vermelhidão. E sinto teu corpo, agora. Deixo de te amar! Independe de mim mas, mesmo se quisesse, não poderia mais te jurar eternidades. Você deixou de ser e passou a existir. Saiu de minha cabeça, escapuliu de meu coração e tomou conta de mim por completo. Não mais amo, mas agora gosto. Gosto de você! De todas as suas inconstâncias, multiplicidades e temperamentos. Qual é a sua!? Fico tentado a perguntar. Num dia, gargalhamos. Noutro, um sorriso-nojinho acompanha teu aceno de mão. É típico desse mundo sensível ser incerto. A bela verdade da sua imagem deu passagem ao frio na barriga que as tragédias e seus finais imprevistos me causam. Troquei a segurança e a calmaria do céu pelas ondulações traiçoeiras do oceano. Não consigo voar, mas nadar eu sei. Desconheço seu intento mas, enquanto meu barquinho de papel aguentar, estarei derivando por aí. Com ou sem você...

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