quarta-feira, 20 de abril de 2011

Pourparler

A vida como encontro. Não o encontro dos enamorados, mas o choque de dois corpos quaisquer, corpos estranhos. Esbarrão. A vida como um, dois, dez, muitos esbarrões. E é nesse atritar dos corpos que se produz o calor e a energia da vida. Por vezes, esses choques danificam os corpos, grafando-os de memórias e juízos. Corpo cheio de rachaduras, é o corpo vivo. Corpo de todos nós. De tanto ser cindido, o corpo cansa e quer des-cansar, na esperança tola de voltar a seu estado original, pré-dano, pré-juízo. Os processos são irreversíveis, no entanto. E, assim sendo, vai ficando cada vez mais difícil de encontrar um corpo outro que aceite as suas cicatrizes. Duas alternativas, para o corpo. Ou desiste de jogar o jogo dos encontros e se entrega à imobilidade; ou se lança, mais uma vez, na imprevisibilidade dessa dança, até encontrar um corpo segundo que aceite as suas feridas, carregadas de história. Dois corpos a sangrarem em uníssono. Duas vidas, dois tempos a se enlaçarem. Mas o jogo dos encontros tem a infeliz regra de nunca acabar, de nunca se deter. Não há “pause”. Não há represa para esse rio. Conclusão: fiquemos atentos para que o barqueiro não passe sem nos levar com ele. Aqueronte, mesmo imortal, não espera os corpos para sempre…

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