terça-feira, 10 de agosto de 2010

Meio-amargo

Antes dos 20, já era moço dedicado às filosofias. E dos bons! Formei e me formei em bons espaços, grandes o suficiente para se brincar de pique-esconde. Lá, travei debates com almas gigantes, com as quais aprendi a apanhar. E, mais importante, vivi encontros maravilhosos com os mais brilhantes sóis. Tinha a cabeça nos céus e, mesmo andando sempre um ou dois palmos acima do chão, estava atento ao doloroso concreto - velho amigo de todas as quedas! - sob os meus sapatos gastos. Ainda em juventude, escrevo uma tese: critico alguma coisa usando o pensamento de não sei quem propondo uma nova prática para não sei onde. Coisa bonita, bem amarradinha. Estudei, conversei e discuti, por demais. Tive muitas dores de estômago mas, finalmente, tornei-me homem doutor. Construi amizade com muitos e inimizades com todo o resto. Acontece. Fruto da estabilidade. Depois de algum tempo, só ajeitando papéis, a escrita me retorna. Começo a dissertar sobre filósofos e artistas. Corrijo-me. Não "sobre", mas "entre". Não falo do já falado nem replico o já aplicado. Tenho o bom gosto de sempre querer o diferente. Talvez por isso eu não seja um intelectual: eu penso, pois! Começo a me afamar. Se isto é bom ou ruim, nem sei. Nem quereria saber destes problemas falsos. De falsidades, bastam-me as minhas. Meus livros, escritos no silêncio ruidoso que costuma me incomodar, começam a circular por aí. E por aqui. E por lá, também. Vai, inclusive, mais longe que as bandas de lá e precisa passar por tradução e tudo o mais. Permito-o, com alguma tranquilidade. Espaços são construídos sobre o meu nome e o tempo corre através deles. Envelheço! Satisfeito com o já feito e moído das constantes batalhas, meu corpo resolve descansar. Minhalma, no entanto, vaga por aí. Vaga a ponto de assistir - anos, décadas, talvez séculos depois! - um menino lendo um - e só um, saliento - dos textos que escrevi. Texto lido longe de onde nasci, muito tempo depois que morri e numa lingua que nunca aprendi. O moleque dá seu veredicto: "Esse cara é um idiota! Não escreve coisa com coisa...". Desconfio que seja um problema crônico. Inteligência estudiosa, talvez. Fosse ele um surfista relaxado, saberia esperar o melhor momento para entrar na onda. Que coma areia, então! Viro e me reviro, pra poder descansar em paz mas, depois de uma dessas, quero mais é um pé pra puxar. Acho que já chegou a hora de escrever um post mortem. Nunca mais publiquei algo inédito, mesmo...

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