domingo, 21 de abril de 2013

"Tá com pena? Leva pra casa!"

Esse odioso "argumento" dos defensores da redução da maioridade penal possui um erro crasso e demonstra o quanto tal posicionamento é um imbróglio, um nó moralista que não intenciona pensar os problemas do Estado, da Sociedade Civil e da sua mal-colocada relação (o Sujeito e o Objeto da política), mas apenas manter as coisas como são, tais e quais, alocando o lúmpen da civilização aos lixões asilares que a própria civilização produz. A noção de "criminoso" não é nascida das relações diretas de um homem com o outro, mas sim um termo jurídico advindo do moderno código penal e de uma sociedade regulada por um Estado normalizador. Não existiram "criminosos", assim sendo, em nenhum outro momento da história anterior à modernidade. Sócrates, corruptor da juventude, não foi um "criminoso". Se o indivíduo (outra noção moderna) é coptado como "criminoso", é porque o próprio Estado já o identificou como figura que atenta o bem, a ordem e o progresso, logo, o próprio Estado: foi Platão o primeiro a identificar a geometria espacial com a ordem social, e esta com o bem, o belo, o justo, o verdadeiro, sendo todas as demais maneiras de se organizar a vida e de se estar junto identificadas com o caos, o nada, o não-ser; essa "torção platônica" dura até o hoje, ao que parece. Ser "criminoso" é ser obrigado a passar pelo crivo institucional da penalidade e do encarceramento, punições típicas da sociedade francesa desde o século XVII - as tais lettres-de-cachet - mas que, todos sabemos, não "reformam" nada. Logo, não posso levar o "criminoso" para minha casa, pois a própria noção de "criminoso" - criação via Estado - o obriga a ser condenado numa instituição asilar, assim como o filho mal-criado é obrigado a passar uma temporada trancado em seu quarto. Não posso nem devo, insisto, "levar pra casa", pois o "criminoso" é um problema "do Estado", "do Social", e não individual, subjetivo, um problema de um homem com o outro. Resolver problemas que são da esfera do Estado e de suas instituições pela via individual é crime, inclusive. Não é uma questão de "pena", mas de pactuar devidamente com a própria lógica do Estado. Não é um "problema meu", mas um "problema nosso", nosso enquanto estrutura geométrica e organização social regulada por um terceiro (o tal do Estado). O curioso é que a investida de "mandar levar pra casa", além de anti-lógica, é anti-estatal, e advém dos que ainda defendem e professam a sua fé no Estado, na ordem e no progresso. Os mesmos que, mais curiosamente ainda, dizem que "o Brasil não tem jeito" ou que "na política, só tem ladrão". É difícil - mais que difícil, a maior das dificuldades da retórica - argumentar com um pombo enxadrista.

Nenhum comentário: