sábado, 28 de março de 2009

Saint Jean-Baptiste

- O senhor já examinou com atenção, nas fotografias instantâneas, os homens andando... Pois bem! O que o senhor reparou?
- Que eles nunca parecem estar se deslocando. Em geral, eles parecem estar imóveis sobre uma única perna ou saltando em um só pé.
- Exatamente! E veja, por exemplo, meu Saint Jean: é representado com os dois pés no chão, mas é provável que uma fotografia instantânea de um modelo que executasse o mesmo movimento mostrasse o pé de trás já elevado e se elevando para o lado do outro. Ou ainda, ao contrário, o pé à frente ainda não teria chegado ao chão se a perna de trás ocupasse na fotografia a mesma posição do que na estátua. Ora, é exatamente por este motivo que o modelo fotografado teria o aspecto bizarro de um homem subitamente atingido por uma paralisia. E isto confirma o que acabei de lhe dizer sobre o movimento da arte. Se nas fotografias, os personagens flagrados em movimento realmente parecem paralisados no ar, é porque todas as partes de seu corpo estão reproduzidas exatamente no mesmo vigésimo ou quadragésimo de segundo. Não há aí, como na arte, desenvolvimento progressivo do gesto.
Aí Gsell rebate:
- Pois bem! Quando, na interpretação do movimento, a arte se encontra em desacordo completo com a fotografia, que é uma testemunha mecânica irrecusável, ela evidentemente altera a verdade.
- Não – responde Rodin – O artista é que é verídico e a fotografia mentirosa, pois na realidade o tempo não se detém jamais e, se o artista consegue produzir a impressão de um gesto que se executa em diversos instantes, sua obra é certamente bem menos convencional do que a imagem científica onde o tempo é bruscamente suspenso...
Transcrição de Paul Virílio duma célebre entrevista feita por Paul Gsell com o escultor Auguste Rodin, a propósito de suas obras Age d´Airan e Saint Jean-Baptiste. In VIRILIO, Paul. A máquina da visão. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002, pp. 14-15.

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